A depressão está nos lugares por onde passamos, na vida real, na literatura, no cinema, na poesia, no trabalho, na família, amigos e até quem sabe... em dado momento da existência até em nós mesmos. Não há como escapar de algum tipo de contato com esse mal da existência humana.
Estaria alguém imune a ela? Com certeza não. As grandes decepções, perdas importantes, conflitivas intrapsíquicas podem ou não evoluir para uma depressão.A depressão para ser clinicamente diagnosticada necessita de um quadro sintomático bem definido, entre os sintomas podem estar: isolamento afetivo, dores no corpo e na cabeça, tristeza profunda que não passa, alterações do sono, apetite e libido, apatia generalizada, dificuldade de executar atividades da vida diária antes realizadas de modo quase automático, desesperança, alterações cognitivas na memória, atenção e outros, sentimento de menos valia, ideias de morte, ideias de suicídio e em casos mais graves tentativas de suicídio.
Haveria momentos específicos em que a depressão poderia encontrar brecha a ponto de instalar-se no indivíduo? Sim, podemos ilustrar com os seguintes exemplos: perdas expressivas, envelhecimento, aposentadoria, situações de exigência social como por exemplo a perfeição estética e os conflitos que daí podem surgir se o sujeito insistir em acatar esse imperativo social ou ainda o poder de consumo, onde o valor do sujeito fica confundido com o quanto ele consome. Além disso, é “proibido” sofrer, temos que ser malhados, belos, esbeltos, inteligentes, etc.
Uma passagem com certa tranquilidade por tais momentos vai depender da estrutura psíquica do sujeito em questão. Trago isso para enfatizar a singularidade do ser humano e portanto da depressão. Além do mais, pensamos que esses momentos cruciais podem ser desencadeantes, mas não causa única da depressão. Cada ser com depressão tem uma história singular e absolutamente entrelaçada com seu processo depressivo. Os sintomas como descritos acima são semelhantes entre os portadores de tal malestar emocional mas a origem é de cada um.
A depressão não escolhe sexo, classe social ou idade. Ocorre na depressão, uma perda importante na qualidade da comunicação intersubjetiva, ou seja, nos relacionamentos e um empobrecimento subjetivo, ou seja, interno bastante sérios. Desinteresse por quase tudo, todos aspectos de sua vida podem ser atingidos, vida afetiva, profissional, sexual, social. Sua produtividade despenca, perde seu envolvimento com a vida e o contexto no qual está inserido.
Por outro lado, o enfrentamento nu e cru com a verdade de seu estado, pode significar num certo sentido um retorno da pessoa à animação, à vida. Existe uma necessidade de tratamento e a intensidade do quadro vai ser determinante na indicação do mesmo.
A escuta clínica da depressão é parte vital do tratamento e exige tempo para sair da paralisia afetiva, da imobilidade corporal, tempo para recuperar o ser desejante que há dentro dele, para sair do isolamento afetivo. O discurso do paciente vai se tornando mais livre, até que ele possa suportar falar de sentimentos e emoções, carregados de recordações, digerir psiquicamente, lutos ainda não elaborados é o momento de dar significado, sentido a seus sofrimentos. Aos poucos, vincula-se ao psicoterapeuta a ponto de compartilhar verdadeiramente seu sofrimento.
Cada pessoa tem um tempo interno isso significa que a evolução do tratamento e a recuperação, também são únicos, mas não há como esperar respostas a curto prazo. Além disso uma certeza, abandono de tratamento antes da hora provocam em muitas pessoas recaídas importantes. Por tanto a implicação no tratamento são fundamentais para sua melhora. Quanto mais próxima está de nós a depressão maior pode ser a resistência em aceitá-la como um quadro que precisa de tratamento.
Uma das dificuldades em aceitar a dor psíquica, é o fato de ela não ser localizável objetivamente. Não há um corte, uma fratura, não visivelmente... fica difícil chegar perto de algo tão singular, “profundo” e ... invisível...Muitas vezes a depressão representa uma ruptura, a quebra de um longo silêncio, que pode ser de praticamente uma vida ... É a via encontrada pelo sujeito para ter acesso a um psíquismo mais saudável.
A escuta é do sujeito psíquico com depressão, vivente de um mundo real, único, necessitando inaugurar e refazer contatos, principalmente consigo próprio.
Luciane Lemos - CRP 07/06648